Manuel Ignacio de Mello

(1761-1832?)


Nasceu em Miranda do Corvo a 4/8/1761, filho de Joaquim José da Silva (c. 1730-?), Bacharel em Medicina pela Universidade de Coimbra, e de sua mulher D. Tereza Luiza Dorotêa de Mello (c. 1740-?)

F. em Mértola c. 1832? (ainda era vivo em Março de 1832)

Casou 1ª vez em Janeiro de 1791 com D. Antónia Jacinta Navarro (29/12/1767-sep. 13-03-1806), filha de André Francisco Navarro, natural de Mértola, e de Cláudia Margarida de Arnedo (c. 1727-1802), natural de Portimão, de quem teve:

Depois de dez anos de viuvez, Manuel Inácio de Mello casou pela 2ª vez, aos 54 anos, a 03/02/1816, com uma rapariga de 18 anos (mais nova do que a sua filha Jerónima), D. Antónia Maria Benedita de Vargas (12/04/1798-02/08/1851)[1], filha de Ambrósio José de Vargas e de D. Maria Rita da Conceição Valadas (casados em Mértola a 15/05/1794), de quem teve:


Levanta-se logo aqui a questão fundamental: de onde aparece o apelido Mello Garrido, que se transmitiu desta forma, como um apelido composto, durante mais de 200 anos?

Teoricamente, e como nesta época frequentemente os filhos usavam os apelidos dos pais "à espanhola", ou seja, com o apelido do pai primeiro e o da mãe no fim, Manuel Inácio devia ser "da Silva e Mello", como usaram os seus irmãos José Máximo e Maria Máxima. Mas não encontro nenhuma referência a ele com este nome. Mesmo os seus irmãos aparecem frequentemente apenas como José Máximo de Mello e D. Maria Máxima de Mello.

Depois, pela lógica, os filhos de Manuel Inácio deveriam ser "qualquer-coisa da Silva" (Navarro da Silva e Vargas da Silva), ou "Silva qualquer-coisa", se continuasse a usar os apelidos à espanhola. Mas não; o que Manuel Inácio transmitiu às duas mulheres e a todos os filhos foi o seu apelido materno, Mello...

E de onde vem o apelido Garrido?

Poderia legitimamente supor-se que Garrido seria o apelido da mulher de Manuel Inácio, e que, embora transmitindo o apelido de sua mãe (D. Tereza Luiza Dorotêa de Mello) e juntando-lhe o apelido da mulher no fim, os filhos usariam apelidos de ambos os pais. O problema é que todos os filhos de Manuel Inácio, tanto os do 1º como os do 2º casamento, assinam "de Mello Garrido"... e nenhuma das suas mulheres parece ter-se chamado Garrido, senão ainda se podia pôr a hipótese de ambas serem Garrido (irmãs ou primas; não era nada invulgar um viúvo casar com uma cunhada)... Mas, por exemplo, a segunda mulher de Manuel Inácio aparece no assento de óbito como D. Antónia Benedita de Vargas e Mello, e o filho primogénito de ambos, Jacinto Ignacio, assinou sempre "de Mello Garrido". É uma questão ainda sem resposta. Talvez algum dos primos que veja este site tenha mais informações que ajudem a esclarecer o mistério...


Manuel Inácio de Mello é uma Figura. Foi militar, como se depreende do seu testamento[2], e foi Capitão-Mor e Governador Militar de Mértola pelo menos desde 1812 (quando é referido como tal num Baptismo na Corte do Gafo em que foi Padrinho) e até Julho de 1827, sendo responsável pelo comando das milícias da vila.

Miguelista convicto — e repare-se que o seu testamento é de 1828, e deve ter falecido em 1832 ou pouco depois, precisamente no período em que D. Miguel estava no trono e era considerado por uma boa parte dos portugueses, se não mesmo pela maioria, como o legítimo Rei de Portugal —, Manuel Inácio de Mello tem o gesto, quanto a mim delicioso do ponto de vista histórico, de deixar em testamento ao Rei D. Miguel a sua espada e um par de pistolas, obtidas nas circunstâncias que o mesmo narra no dito testamento:

[...] Disse elle Testador, que deixa a Sua Magestade El Rey o Senhor Dom Miguel Primeiro a sua Espada do Uniforme, e hum par de Pistolas, que tirou a hum Tenente Coronel Francez nos suburbios de Arouxe a onde elle Testador encontrou o dito Tenente Coronel com huma Escolta de vinte cinco soldados os quais se Desperçarão com a força delle dito Testador, que não excedia a doze Fuzileiros, e trazendo Prizioneiro o Tenente Coronel o remeteu ao Ministro de Estado, que então hera Dom Miguel Pereira Forjáz: não hé pello valor das Ditas Armas, quelle Testador as offerece a Sua Magestade, mas sim para que as tenha no seu Arsenal, e as mande dar a hum Official que se obrigue a nunca as ter acobardadas, e defenda com ellas os Direitos de Sua Magestade, como o fez o seu possoidor [...]

O seu testamento, de resto, é uma peça extremamente interessante e bem reveladora da pessoa que ele foi e do espírito da época. Pode ser visto na íntegra aqui:

Testamento de Manuel Ignacio de Mello

Para além da digitalização de todas as páginas, incluo uma transcrição do testamento, tanto quanto consegui decifrar o texto.


Manuel Inácio de Mello reformou-se como Capitão-Mor de Mértola em Julho de 1827, com 65 anos[3]. O seu irmão José Máximo da Silva e Mello sucedeu-lhe no cargo.

Já quase no fim da vida, Manuel Inácio de Mello foi (com José Joaquim da Palma) Procurador do Braço dos povos pela vila de Mértola às Cortes de 1828, assinando o auto que reconheceu D. Miguel como legítimo Rei de Portugal e aboliu a Carta Constitucional de 1826.

Quando morreu, com cerca de 71 anos, o que para a época se podia considerar uma idade avançada, deixou pelo menos quatro filhos menores, tendo a mais nova, D. Carolina, provavelmente 6 ou 7 anos. Nos termos do seu testamento, foi o filho varão mais velho vivo, o Padre Eduardo Frederico de Mello Garrido, nomeado tutor dos irmãos menores.




[1] Curiosamente, Manuel Inácio de Mello e D. Antónia Maria Benedita de Vargas eram compadres, porque tinham sido ambos Padrinhos a 20/07/1812 de uma criança da Corte do Gafo de nome Antónia, filha de Francisco Baptista Sobrinho e de Ana Maria Rosa. Manuel Inácio já era Capitão-Mor e tinha cinquenta anos; D. Antónia Maria Benedita tinha catorze. Casariam quatro anos depois, certamente com as devidas dispensas eclesiásticas (por serem compadres).

[2] Desde logo, ao referir-se ao filho Eduardo nos seguintes termos:

[...] tendo Criado seu filho Eduardo no Estado Ecclesiastico no qual tem mostrado não o valor da Espada de seu Pay, mas as Virtudes Morais do mesmo [...]

[3] "Gazeta de Lisboa", nº 175, de 26 de Julho de 1827, pg. 1007